O Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA (CDC) planeja realizar um grande estudo sobre uma possível conexão entre vacinas e autismo, um tema de interesse para Robert F. Kennedy Jr., Secretário de Saúde e Serviços Humanos. Isso ocorre apesar da ampla pesquisa científica que já demonstrou que não há relação entre vacinas e autismo.
Durante sua audiência de confirmação no Senado, Kennedy foi questionado pelo senador republicano e médico Bill Cassidy sobre suas opiniões a respeito das vacinas.
“Você pode garantir às mães, de forma inequívoca e sem ressalvas, que as vacinas contra sarampo e hepatite B não causam autismo?”, perguntou Cassidy.
“Se os dados mostrarem isso, eu absolutamente o farei,” respondeu Kennedy.
Mas os dados já existem—e em grande quantidade. Há evidências científicas robustas de que vacinas não causam autismo. No entanto, Kennedy e outros que contestam essa pesquisa afirmam que os estudos são falhos ou insuficientes para descartar completamente uma possível ligação. Isso levanta a questão: será que mais dados poderiam mudar a opinião dessas pessoas?
Se a falta de “dados confiáveis” for realmente o motivo pelo qual algumas pessoas evitam vacinas, é importante entender quais novas informações poderiam convencê-las. Como a maioria dos pais não lê ou analisa estudos científicos por conta própria, essa pergunta deve ser feita aos líderes do movimento antivacina, cujas opiniões influenciam milhões de americanos.
No entanto, há um impasse:
- Se céticos das vacinas realizarem seu próprio estudo, a comunidade científica e o público em geral podem não confiar nos resultados.
- Se pesquisadores que já defenderam as vacinas conduzirem um novo estudo, os céticos provavelmente rejeitarão os resultados, assim como fizeram com pesquisas anteriores.
A percepção de viés pode comprometer a busca pela verdade científica.
Se o CDC realmente quiser realizar esse estudo sobre vacinas e autismo, há alguma forma de garantir que seus achados sejam confiáveis para todos?
Colaboração adversarial: uma abordagem inovadora
Uma possível solução é a colaboração adversarial, um método desenvolvido pelo Prêmio Nobel de Economia Daniel Kahneman. Ele propôs essa abordagem como alternativa à chamada “ciência conflituosa”.
A colaboração adversarial ocorre quando pesquisadores com pontos de vista opostos trabalham juntos para chegar a uma conclusão de forma transparente e mutuamente acordada.
Segundo o Adversarial Collaboration Project da Universidade da Pensilvânia, essa estratégia é útil quando os debates se tornam polarizados e politizados. Para que funcione, ambas as partes devem concordar com três compromissos fundamentais:
- Esforço de boa-fé para entender e representar corretamente o ponto de vista oposto.
- Definir um plano de pesquisa antes do estudo, com metodologia e critérios que possam potencialmente mudar suas opiniões.
- Seguir o plano estabelecido e publicar os resultados conjuntamente, independentemente da conclusão do estudo.
Os defensores desse método argumentam que ele pode:
✅ Evitar erros e vieses na pesquisa.
✅ Acelerar a produção de conhecimento científico, evitando a duplicação de esforços entre grupos opostos.
✅ Gerar mais credibilidade, pois ambas as partes validam os achados.
Essa abordagem já foi bem-sucedida no passado. Ela ajudou a esclarecer debates científicos sobre memória de curto prazo, viés de gênero na academia e até a relação entre felicidade e renda.
Um modelo para pesquisas futuras?
Implementar uma colaboração adversarial em larga escala não é simples, mas se o CDC e o NIH querem conduzir mais estudos sobre vacinas e autismo, não há razão para que essa estratégia não seja aplicada—especialmente considerando a importância do tema.
Para isso, ambas as partes precisam seguir regras claras, incluindo:
- Definir previamente quais dados serão coletados e quais métodos serão usados.
- Especificar como os resultados serão analisados.
- Estabelecer um protocolo para resolver discordâncias na interpretação dos dados.
Se bem executado, um estudo publicado conjuntamente por céticos e defensores das vacinas poderia gerar um debate mais produtivo sobre políticas de imunização.
Por outro lado, se nenhum dos lados estiver disposto a participar, isso levantaria dúvidas sobre a seriedade de suas preocupações. Se céticos dizem que as evidências atuais são insuficientes, eles deveriam ser capazes de explicar quais provas seriam suficientes. Da mesma forma, se os defensores das vacinas querem aumentar as taxas de imunização, deveriam estar dispostos a adotar estratégias para reduzir a desconfiança na ciência, um dos principais fatores da hesitação vacinal.
Se bem-sucedida, uma colaboração adversarial sobre vacinas poderia servir como modelo para resolver outros debates politizados em saúde pública e ciência. Restaurar a confiança no método científico, sem condescendência e com transparência, pode ser o primeiro passo.
E se aqueles que criticam a ciência não quiserem se engajar nesse processo, talvez o problema não seja a qualidade das evidências disponíveis, mas sim a relutância em aceitar o que a ciência já demonstrou.
Com informações de Time.
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