O crescimento das superbactérias é uma preocupação concreta, e muitos especialistas têm destacado a urgência de criar novos antibióticos. No entanto, a falta de empresas engajadas nesse esforço é atribuída a um modelo de negócios deficiente.
É comum observar pedidos de falência entre startups que buscaram a aprovação da Food and Drug Administration (FDA), a agência regulatória de medicamentos dos Estados Unidos, para desenvolver novos antibióticos desde 2017. No entanto, todas essas empresas acabaram declarando falência, sendo adquiridas ou encerrando suas atividades. O motivo principal, conforme alegado pelas próprias empresas, é que o processo de desenvolvimento e comercialização de antibióticos não se mostrou financeiramente viável, resultando em falta de lucratividade.
Esses novos produtos deveriam ser utilizados de maneira controlada para combater infecções graves e desacelerar o desenvolvimento da resistência bacteriana. No entanto, essas empresas estabeleceram preços cerca de 100 vezes mais elevados do que os antibióticos genéricos prescritos por médicos há décadas, que custam apenas alguns dólares por dose. Como resultado, a maioria desses novos antibióticos enfrentou um fracasso significativo em termos de vendas, conforme relatado pelo The Wall Street Journal.
Um caso ilustrativo dessa situação é o da Nabriva Therapeutics, que demitiu todos os seus funcionários neste ano e está buscando um comprador. Isso aconteceu apenas quatro anos após a aprovação pela FDA do seu antibiótico Xenleta para o tratamento de pneumonia. Esse cenário é ainda mais evidenciado pelo fato de que cerca de 80% dos 300 cientistas que trabalhavam nessas empresas abandonaram o campo de desenvolvimento de antibióticos, de acordo com Kevin Outterson, diretor executivo do CARB-X, um grupo financiado pelo governo que promove pesquisas na área.
A Nabriva estabeleceu o preço de seu tratamento de cinco dias com o produto em mais de mil dólares, quase R$ 5 mil, enquanto os antibióticos genéricos para tratar pneumonia fora do ambiente hospitalar geralmente custam menos de US$ 100, ou R$ 500. Como resultado, menos de 100 dos 800 hospitais contatados pela empresa adquiriram o Xenleta.
Isso levanta a questão sobre a falta de incentivos para o desenvolvimento de novos produtos. Ryan Cirz, cofundador da Achaogen, que pediu falência em 2019, menos de um ano após a aprovação pela FDA de seu medicamento Zemdri para infecções complicadas do trato urinário, argumenta que os novos antibióticos deveriam receber apoio semelhante ao concedido aos tratamentos para doenças raras.
A legislação dos Estados Unidos oferece incentivos significativos, incluindo subsídios, benefícios fiscais e períodos adicionais de exclusividade de mercado, para empresas farmacêuticas que desenvolvem tratamentos destinados a doenças que afetam menos de 200 mil pessoas no país.
No entanto, o antibiótico da Achaogen foi projetado para combater um tipo grave de infecção resistente que afeta aproximadamente 13 mil pessoas anualmente nos Estados Unidos, e até metade dos pacientes hospitalizados com essa infecção fatalmente. Essas pessoas fazem parte das mais de 35 mil que perdem a vida anualmente devido a infecções bacterianas ou fúngicas resistentes a medicamentos no país, um número que tem aumentado nos últimos anos. Isso destaca a necessidade de revisar as políticas de incentivo para incluir tratamentos para infecções graves e potencialmente letais, mesmo que afetem um número limitado de pessoas.
No ano em que o medicamento Zemdri foi aprovado, a Achaogen gastou quase US$ 200 milhões, equivalente a quase R$ 1 bilhão, em despesas relacionadas à fabricação, marketing e outros custos, no entanto, as vendas do medicamento geraram apenas US$ 800 mil, quase R$ 4 milhões, em receita. Isso resultou em uma queda de mais de 96% no preço das ações da empresa e, eventualmente, levou ao pedido de falência em 2019. Essa situação destaca os desafios financeiros enfrentados pelas empresas que buscam desenvolver novos antibióticos.
Uma alternativa para enfrentar esse desafio financeiro é considerar modelos de pagamento alternativos. Um exemplo é o modelo de assinatura implementado pelo Reino Unido em 2019, no qual as farmacêuticas são remuneradas com base no potencial valor dos novos antibióticos para a saúde pública.
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